Passei alguns dias, afastada dos
estudos espiritualistas. Além das turbulências vivenciadas nas semanas
anteriores, estava dando-me umas férias para voltar posteriormente a todo
vigor, afinal, tenho muito ainda para conhecer e aprender com a
Espiritualidade.
Especialmente ontem, uma amiga
procurou-me para tirar uma dúvida. Ela começou a estudar recentemente
o velho testamento da bíblia e a questão foi a seguinte. No livro de Levítico
19:26, encontramos as instruções:
“Não pratiquem adivinhações e magia.”
“Não se dirijam aos
necromantes, nem consultem os adivinhos, porque eles tornariam vocês impuros.
Eu sou Javé, o Deus de vocês.”
(Bíblia Sagrada – Edição Pastoral Paulus)
O questionamento dela seria sobre
a posição do Espiritismo referente às recomendações que Moises recebeu de Deus
para guiar o recém-povo liberto Hebreu. No posicionamento de estudante da
doutrina espírita, acabei não sabendo responder a dúvida na hora, pedindo-lhe
desculpas pela falta de informação. E isso acabou me perturbando, fazendo com
que eu procurasse nas Escrituras e no Livro dos Espíritos conclusões saudáveis
a respeito dessa passagem. Por favor, em nenhum momento estarei me posicionando
contra alguma religião e nem é minha intenção atacar as mais variadas
interpretações que surgem a partir de uma leitura bíblica, mas questioná-las!
O que eu entendi sobre a dúvida
dela e acredito que este era seu questionamento, segundo as devidas passagens,
a prática do Espiritismo seriam uma afronta as Leis que Deus estabeleceu aos
homens daquela época. Porque, teoricamente e na prática, os Espíritas buscam “comunicar”
com os “mortos” via as manifestações mediúnicas.
Entretanto, para chegarmos a
uma conclusão mútua, temos que definir em conjunto o que é a Morte e realmente
nos perguntarmos o conceito que atribuímos a Alma ou Espírito, acreditando que
ambos são capazes de sobreviver à efemeridade da existência física/material. Mas não são todos que adotam essa ideia. Perguntem-se: A Alma existe ou não existe? Seu espirito adormece junto com seu corpo esperando o retorno de Jesus nos dias apocalípticos?
Sobre o livro Levítico – Manual
de condutas escritas por Moisés.
Antes também de analisarmos
devida passagem, temos que levar em conta o tempo a qual ela foi atribuída. No
mesmo livro de Levítico, encontramos instruções para o povo hebreu, sendo uma
espécie de manual para condutas que deveriam ser adotadas na pequena sociedade
que se formava. Pra entender sobre a libertação desse povo, recomendo um filme
bem light que retrata o cenário que os Hebreus se encontravam, chama-se o
Príncipe do Egito. Esse manual de condutas escritas por Moisés vai desde
instruções para lidar com os leprosos, a forma como as pessoas deveriam fazer
sacrifício de animais em nome de Deus e até mesmo pagamento do dízimo.
Quem não
seguisse à risca o manual, seria castigado por Deus!
Essa projeção de que Deus
é um ser que castiga, impõe, domina, foi algo predominante naquela época e
ainda existe nos dias atuais, sendo propagado por algumas religiões com base cristã.
Encontramos também em Levítico a
famosa Lei de Talião: Olho por Olho, Dente por Dente. Além disso, mostra-se o
quão errôneo são a adoração ao “Deus da Morte”, condenando a consulta aos
necromantes (mortos) e também as práticas adivinhatórias. É importante ressaltar
que o povo hebreu fora escravizado durante anos pelo Egito. Não seria estranho
que os hebreus adotassem os ritos de passagem daquela cultura a qual estavam
inseridos. Deus da Morte, na cultura egípcia é Anúbis, aquele que está
relacionado com a mumificação e a vida pós-morte, segundo a mitologia daquele
local. Quando Moisés libertou esse povo, muito da cultura já estavam enraizadas
nas atitudes dos hebreus. Esse livro Levítico é um manual de condutas que
Moisés estabeleceu para que se evitasse a prática e adoração de outros “deuses pagãos”.
No Evangelho Segundo o Espiritismo encontramos explicações interessantes a respeito dessas passagens e as leis estabelecidas por Moisés.
Há duas partes Distintas na lei mosaica: a de Deus, promulgada sobre o Monte Sinal, e a lei civil ou disciplinar, estabelecida por Moisés. Uma é invariável, a outra é apropriada aos costumes e ao caráter do povo, e se modifica com o tempo.
A lei de Deus está formulada nos dez mandamentos seguintes:
I – Eu sou o Senhor teu Deus, que te tirei da terra do Egito, da casa da servidão. Não terás deuses estrangeiros diante de mim. Não farás para ti imagens de escultura, nem figura alguma de tudo o que há em cima no céu, e do que há embaixo na terra, nem de coisa que haja nas águas debaixo da terra. Não adorarás nem lhes darás culto. II – Não tomarás o nome do Senhor teu Deus em vão.
III – Lembra-te de santificar o dia de sábado.
IV – Honrarás a teu pai e a tua mãe, para teres uma dilatada vida sobre a terra que o Senhor teu Deus te há de dar.
V – Não matarás.
VI – Não cometerás adultério.
VII – Não furtarás.
VIII – Não dirás falso testemunho contra o teu próximo.
IX – Não desejarás a mulher do próximo.
X – Não cobiçarás a casa do teu próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento, nem outra coisa alguma que lhe pertença.
Esta lei é de todos os tempos e de todos os países, e tem, por isso mesmo, um caráter divino. Todas as demais são leis estabelecidas por Moisés, obrigado a manter pelo temor um povo naturalmente turbulento e indisciplinado, no qual tinha de combater abusos arraigados e preconceitos adquiridos durante a servidão do Egito. Para dar autoridade às leis, ele teve de lhes atribuir uma origem divina, como o fizeram todos os legisladores dos povos primitivos. A Autoridade do homem devia apoiar-se sobre a autoridade de Deus. Mas só a ideia de um Deus terrível podia impressionar homens ignorantes, em que o senso moral e o sentimento de uma estranha justiça estavam ainda pouco desenvolvidos. É evidente que aquele que havia estabelecido em seus mandamentos: “não matarás” e “não farás mal ao teu próximo”, não poderia contradizer-se, ao fazer do extermínio um dever. As leis mosaicas, propriamente ditas, tinham, portanto, um caráter essencialmente transitório.
Desde que comecei a estudar essas questões da alma, sempre me perguntei o por quê da existência de um Deus Castigador. Nunca entrou na minha cabeça que Deus fosse um Ser raivoso, sentisse ira ou decepção pelos humanos (vide a história de Nóe, Paraíso e etc)! Sinceramente, não acredito que Ele tem características tão humanas como nós muitas vezes projetamos Nele. Outra coisa a se mencionar. O Deus do Velho Testamento e do Novo Testamento e aquele que Jesus ensina, são totalmente diferentes! Se nas antigas escrituras temos um Deus que necessitamos ter temor para se crê nele, nas escrituras recentes, Jesus nos ensina a existência de um Deus de Amor, Misericordioso, Benevolente, Humilde! Uma discrepância evidente.
Sobre o que foi escrito acima. Acredito que seja possível responder as devidas perguntas.
O Espiritismo Kardecista tem como premissas a existência do MUNDO ESPIRITUAL. E em nenhuma vez, negamos a existência do Criador e a perfeição de suas Leis que regem o Universo. Acreditamos em Deus, em Jesus, na Espiritualidade Maior e seus benfeitores, nas Leis de Causa e Efeito, na Reencarnação, na existência da Alma pós-vida e na continuidade da Vida em outras esferas, afinal, Ele mesmo disse: A casa de meu Pai, possui várias moradas.
A Mediunidade, faculdade intuitiva do espirito encarnado que abrem portas para uma comunicação entre aqueles que supostamente "morreram", é um trabalho que busca levar mensagens confortadoras àqueles que perderam um ente querido. Em nenhum momento a "necromancia" é trabalhada, pois o cunho das mensagens não são adivinhações do futuro! Um dos maiores médiuns brasileiros, que trabalhou incessantemente essa faculdade, foi o nosso amado Chico Xavier. Ele é referência de uma conduta totalmente cristã (refiro-se a Cristo e não ao Cristianismo), baseada na humildade, benevolência, caridade e amor! Ensinamentos deixados por Jesus e outras personalidades que nos inspiraram com suas vidas na terra de entrega incondicional ao bem do próximo, como exemplo: Madre Teresa, Gandhi, Martin Luther King, Francisco de Assis e por aí vai!
Chico Xavier levou conforto e esperança aos corações destruídos pela separação temporária da morte nas milhões de cartas que foram entregues! Como isso poderia ser condenado por Deus? Se em cada palavra escrita por Chico, há um registro de um ato de Amor e entrega ao próximo? Se em cada palavra um coração de uma mãe foi confortado, como Deus poderia castigar isso?..
Sobre a consulta com os “mortos”,
a conversação entre vivos e espíritos, o que poderiam me dizer da seguinte
passagem de Jesus encontrada no evangelho de Mateus 17:1 :
“Seis dias depois, Jesus tomou consigo Pedro, os irmãos Tiago e João, e
os levou a um lugar à parte, sobre uma alta montanha. E se transfigurou diante
deles: o seu rosto brilhou como o Sol, e as suas roupas ficaram brancas como a
Luz. Nisso lhes apareceram Moisés e Elias, conversando com Jesus.”
Elias e Moisés, dois profetas que
já estavam “mortos”, então espera. Jesus conversou com o espírito dos dois? É isso mesmo? E a respeito do "Olho por Olho, Dente por Dente", nosso Mestre ensinando que se recebêssemos uma ofensa, jamais deveríamos retribuir na mesma moeda, mas oferecendo o outro lado da face! Outra questão a se mencionar. Não existe morte para os espíritas, afinal, o que morre é apenas o corpo físico, mas o espírito continua vivo! Ou seja, não há consulta com os "mortos", pois os que estão do outro lado, estão bem mais vivos quanto nós, encarnados! Outra passagem interessante para se estudar é a de Lázaro e sua irmã Marta, encontrada em João 11, em que Jesus diz o seguinte:
"Eu sou a ressurreição e a vida; quem crê em mim, ainda que esteja morto, viverá;
E todo aquele que vive, e crê em mim, nunca morrerá. -João 11:25-26"
E pra finalizar a questão da adivinhação, mencionada também nesse "manual" é algo que pode ser indagado. Porque será que José, filho de Jacob, não foi
castigado pela “ira” de Deus devido ao seu dom de saber interpretar sonhos e
assim predizer acontecimentos futuros? Isto é de alguma forma uma arte
divinatória, predizer futuro através de algum oráculo seja ele sonho ou qualquer outra ferramenta, ou será que não?..
Deixemos o benefício da dúvida. Há muito ainda para ser questionado, aprendido e assimilado. Nem tudo deve ser levado ao pé da letra. Imagine se estivéssemos enraizado a Lei de Talião. Olho por Olho e o mundo estaria cego como já dizia Gandhi...
O importante é abrir a mente e nos permitir fazer determinados questionamentos, levando em conta também que bíblia não foi algo que caiu divinamente sob nossos solos, mas foi escrita por homens e modificada pelos mesmos! Alguém se lembra que até uns séculos, as missas eram rezadas em latim e os sacerdotes ficavam de costas para os fiéis e a bíblia muito menos era traduzida? E os livros apócrifos, o que dizer sobre eles e porque não fizeram parte do que hoje conhecemos como "Escrituras Sagradas"? E quanto as outras religiões como Budismo, Hinduísmo, Xintoísmo e etc (tem símbolo nessa imagem que desconheço), são menos importantes e inverídicas? E as mitologias locais, como a grega, romana, celta, nórdica, egípcia, japonesa, são inválidas? E os cultos africanos (umbanda, candomblé) e indígenas não tem nenhuma importância culturalmente falando?
Como já dizia um físico que admiro bastante, Marcelo Gleiser:
"Quando escolhemos um Deus, excluímos todos os outros"