29 de junho de 2019

Descendentes de Caim




O sangue de um inocente fora derramado naquele dia. Seu rosto estava pálido diante ao fato. Suas mãos estavam trêmulas. Seu olhar estava assustado. Uma explosão de sentimentos negativos eclodiu de si e ele não sabia se sentia ódio, se sentia raiva, se sentia nojo, se sentia remorso. Contudo, descartou-se ligeiramente a ideia de remorso ao saber que o ato, ainda que motivado pelo impulso, pois fim naquele indivíduo que nascera do mesmo pai.

A  piedade para com o ocorrido não cabia dentro dele, mas ele sentia por si uma compaixão monstruosa. A que ponto as coisas tinham chegado para que tudo culminasse neste fim? Foi o ódio que se espreitou na própria sombra que observava realizações alheias, desejando ardentemente que estas fossem suas? Foi a inveja que sentira pelo sucesso do outro que o afundava cada vez mais em seus fracassos? O que fizera para atrair tamanha hostilidade do destino a ponto de não reconhecer em si mesmo uma parte da centelha divina? A inveja por não ser aquele que recebia elogios pelo seu esforço; o rancor que nutria todas as vezes que Desagradava o Criador; o levaram a despertar o MAL que já dormia dentro de si. O primeiro ato de maldade cometido a um ser benevolente fez com que esta maldade se alastrasse pelos quatro cantos do mundo. O homem viu a face do mal quando olhou no espelho refletido pelo seu semelhante e não o reconheceu como seu irmão. 

Os indivíduos que reconheceram os pecados de seus antepassados e aceitaram que o mal faz parte da natureza humana tão reconhecida em Caim e em seus atos; lutam para modificá-la, para não perpetua-la, para não torná-la uma tradição nefasta e desonrosa. A natureza humana, ainda que complexa e facilmente direcionável à autodestruição, traz em sua essência a imagem e a semelhança do Criador. 

Ainda que o Mal persiste e teime em nos destruir; o Bem impulsiona a humanidade a reconhecer suas falhas e a motiva a se esforçar para mudar seu próprio impulso a destrutividade. O bem estimula o lado divino da criação, ensinando que a realidade, independentemente de sua dureza e por ora inflexibilidade, pode ser construída de um modo que não ouse a destruir os nossos esforços para se tornar alguém melhor a cada dia.  

21 de junho de 2019

Cobranças que adoecem...




Eu poderia citar "n" coisas que me deixam atualmente estressadas. Reclamar é fácil. Apontar os erros alheios é tranquilo. Julgar uma situação sem conhecê-la por completo, qualquer um é capaz de fazê-lo. Dar opiniões sobre aquilo que não entendemos, mas que achamos que entendemos é tão normal quanto o ato de respirar. Entre tantas enfadonhas formas de vivência humana, o mais estressante de tudo é saber que não estou dando mais conta de lidar com a limitação do outro. 

Minha limitação, reconheço, é não saber lidar com a burrice alheia, com a ignorância dos outros, com o descuido dos invigilantes. Minha frustração é constantemente alimentada pelo dia-a-dia, encontrando pessoas insensatas, dividindo uma parte da minha vida para conviver com humanos limitantes. Logo eu, reclamando de limitações alheias sem cuidar daquilo que me limita. É fácil também cobrar uma postura diferente dos outros. E aqui, presa neste muro de cobranças que minhas limitações internas construíram, alimento um ressentimento por tudo aquilo que ajudou a construir essa sociedade doente a qual vivemos.

É sempre tão mais fácil fazer aquilo que me "apequena" como ser... 
Difícil mesmo é admitir ser humano e crescer com isso.

18 de junho de 2019

Suicídio




Eu vou me arriscar a tentar dar uma explicação sobre o suicídio. Não tenho pretensão de escrever um artigo psiquiátrico ou de psicologia. É apenas uma tentativa de que haja uma explicação para isso. E que com mais uma explicação que isso seja apenas uma forma de aumentar a consciência sobre o assunto. E nada mais que isso.

O suicídio é uma espécie de vírus que é instalado na cabeça do indivíduo. Vai se adaptar a mente hospedeira até atingir seu objetivo. Que é projetar alguma ilusão que lhe programe a ordem de auto-destruição. Pode ser do tipo lentamente planejada com uma única execução "repentina" e fatal. Ou do tipo intermitente com várias tentativas até o irrevogável desfecho. Ainda existe um outro grupo que é menosprezado porque não é considerado "suicídio de verdade". Pessoas que possuem pensamentos e sentimentos suicidas mas que não levam esse a uma consumação final. Como se isso não subtraísse a vida de forma fracionada. E cada perda de vida seja de forma letal, seja de forma que interrompa seu fluir são sim perdas lamentáveis.

E uma vez que esse vírus vai se instalando as alegrias e tristezas são calculadas de forma que se favoreça a indiferença à vida. Momentos alegres podem ser relegados a ausência de sentido. Momentos tristes podem virar incentivo contra o viver. Diagnosticar o suicida em estereótipos extremos não é eficaz. Suicidas são como nós. Tão especiais e comuns quanto nós. Sejam pessoas marginalizadas ou bem inseridas na sociedade. Sejam aqueles que se expressam sobre isso, ou quem cobrirá em silêncio o que está passando.

É uma bomba-relógio que não nos diz quando irá estourar. E quando estoura nós que ficamos somos pegos pelos estilhaços. Queremos culpar alguém para tentar dar uma razão para a dor que nos aflige. Ora queremos culpar quem se foi, ora queremos culpar a nós. E culpa não é o suficiente. Pode ser uma parte de um quebra-cabeça, mas no fundo sabemos que não é capaz de trazer a cura.

Quem teve a chance de ter tido um último gesto de bondade terá que lidar com o sofrimento da impotência ao ver que isso não foi incapaz de parar o processo do auto-extermínio. Quem teve um gesto de discórdia terá que lidar com o sofrimento de nunca mais poder ter um outro ponto final. E não há de ser surpresa. Estamos falando de perceber a morte. Por que o suicídio seria diferente de outras formas de perder quem amamos para a morte?

Seja lá como iremos fazer a respeito, seja racionalmente ou intuitivamente, eu acredito em uma coisa. O suicídio não pode ser anônimo. Não pode ser inominável. Não pode ser inquestionável. Temos que nos rebelar contra esse dogma! Seja lá quantas vezes fracassemos em ter precisão sobre o que dizer a respeito, não podemos relegá-lo a categoria de uma má-sorte a qual é inútil tentar lutar contra. Não podemos aceitar que o suicídio seja como um monstro imbatível que ceifa a vida de quem amamos e simplesmente saia impune disso porque consideramos que é assim que as coisas são. Não! Não são assim! Eu não aceito isso!

Isso não é uma simples luta contra o lado negativo da vida, ou uma luta contra o "mal viver", uma cruzada contra indivíduos desistentes ou contra uma sociedade que sufoca a vida. E eu também não sei o que é essa luta que teremos que travar contra o suicídio. Eu apenas sei que é uma luta digna. Eu não aceito que uma mente que foi condicionada e adoecida a ter apenas o auto-extermínio como opção tenha sido livre para escolher sobre o seu destino de Ser na Vida.

Eu ainda tenho fé na vida. Agora eu tenho fé na vida. E isto é tudo o que tenho e por isso mesmo eu posso e quero compartilhá-la com vocês.

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Ao meu amigo que se foi.

Não irei colocar nos seus ombros o que poderia ter sido ou que poderia ser. Vou aceitar sua vida assim como ela veio e como ela se foi. Vou lembrar de você e ver você nas coisas belas e tristes dessa vida. E quando eu pensar em você vou lembrar de viver e lembrar a outros de viverem também. Sei que não vou conseguir deixar de pensar em uma forma de como eu poderia ter te salvado. Mas também sei que até nisso você está me ensinando a ser humilde, porque eu não sou super-herói e nem tenho super-poderes. Tive sua presença e lembrança na minha vida. E isso é a melhor coisa que você pode me dar e a melhor coisa que eu pude te dar. Vou sentir sua falta cara! Nós nos vemos por aí!

16 de junho de 2019

Esta dor que não fala...



Quando sua alma gritar por socorro não adie o auxílio. Seja o primeiro a amparar a si mesmo, seja o primeiro a admitir para si que necessita de ajuda e que você está aberto a ela. Não deixe que o orgulho lhe faça recusar as mãos daqueles que vem para auxiliar. Não deixe que o pessimismo lhe encaminhe para o poço do desespero e que nem a loucura de seus pensamentos desfaçam o único fio que lhe prende a realidade. E anote estas palavras: "há de passar". Nenhum mal é eterno, nem uma dor é infinita, tudo é cíclico e demasiadamente passageiro. 

O apego ao sofrimento te impede de enxergar a cura, te atrasa de procurar ajuda. Por quanto anos temos silenciado nossa dor? Por quanto tempo temos escondido ela dos outros por medo, por vergonha, por achar que iremos incomodar nosso próximo? Fingir que esta dor não é sua e guardá-la dentro de si, não vai fazer ela sumir de suas vistas. Se você não encarar ela agora, mais tarde ela volta cobrando seu descuido com devidos juros. 

Com Saturno esfregando minha cara no chão, ergo minhas mãos suplicando auxílio. Desta vez não dou conta de lidar sozinha com este peso. Desta vez estou acuada e com medo. Se eu não fizer algo com esta dor, tenho certeza que ela vai me devorar por inteiro, vai devorar minha existência e regurgitá-la como se eu nunca tivesse pisado aqui. Mas não estou pronta para abandonar o barco e enquanto eu tiver forças para remar ao contrário, lutando com tempestades e adentrando neste mar revoltoso, eu enfrentarei qualquer mal, pois Deus está comigo.