Aqui estou eu, falando com meus sentimentos. Algo quer sair,
ganhar forma, ganhar textura com palavras. Onde estou? Não consegui definir.
Estou tentando me concentrar, distinguir cheiros, sons. Ouço vozes e uma
sirene. Estou em um campo. Essas vozes são ríspidas, falam constantemente em
tons agressivos. Eu apenas obedeço. Não falo nada. Não consigo me visualizar.
Minha visão está toda borrada. Tento aguçar meus ouvidos. As vozes mandam,
gritam. Eu tenho medo. Não ouso a contestar, já vi o que eles fazem com quem
grita por seus direitos. E aqui não há justiça. Fomos abandonados. Onde estou? Ouço
apenas o silêncio. Não há lamúrias ou ressentimentos. Todos estão cabisbaixos.
Deitam suas cabeças, sem saber o que esperar do amanhã. Deitam suas cabeças sobre
algo que parece ser um “travesseiro” sem sonhos que possam lhes salvar da desoladora
realidade. Eles também não choram, pois suas almas já derramaram todas as lágrimas,
restando-lhes apenas o silêncio perturbador. Fomos esquecidos. Abandonaram-nos
nesse lugar sombrio. Meus pais ainda não retornaram do banho. Faz muito tempo
que não vejo meus amigos. Eles se esqueceram de mim ou eu me esqueci deles? A
verdade é que esqueci quem realmente sou.
A sirene soa novamente. Eles entram agressivamente,
gritando e batendo na minha gente. Não há tumultos, apesar dos espancamentos.
Não temos mais força para lutar. Não temos coragem para revidar. Eles nós
mandam para o banho. Finalmente! Depois de tanto tempo, finalmente terei
direito a um banho. Caminhamos em fila. Eu não sei direito o que está
acontecendo, mas meu íntimo dá sinais. Caminhamos, pois não temos nenhuma saída.
As batidas aceleram proporcionalmente aos passos dados. O que será de nós
quando adentrarmos aquela sala? Disseram-me que era apenas um “banho”, mas por
que meu coração está tão angustiado? Chegamos. Eles gritam: “tirem suas roupas”!
Todos nós obedecemos, crédulos que realmente será um “banho”. Ah! Quanto tempo
não vejo água, não molho meus cabelos e não a sinto percorrer meu corpo? Fecho
meus olhos e agradeço a Deus, com as mãos levantadas, em pensamento:
“Obrigada
Senhor pelo banho que concedestes aos nossos corpos”.
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