13 de maio de 2024

Envelhecimento e Asilo... Problema ou Solução?

 


A velhice te assusta? As rugas que aparecem indiscriminadamente no seu rosto é motivo de preocupação? E os cabelos brancos que você tenta esconder todo mês por debaixo da pintura? 

Tem gente que tem medo de tanta coisa.
Uns tem medo de morrer mais cedo.
Outros tem medo de barata.
Tem gente que tem medo de envelhecer. 

Atualmente tenho vivenciado muito esse tema da velhice na minha vida. 

É desafiador, confesso.

Tenho um pai de 78 anos, velho, com Alzheimer e outras comorbidades. Ele mora numa casa de repouso. As circunstâncias da situação que estávamos inseridos na época nos fizeram tomar em conjunto (eu e meus irmãos) essa dura decisão de colocá-lo lá. Quem queria viver com o velho? Cheio de manias, teimoso, rabugento, cujo passado foi marcado por suas traições, promessas não cumpridas e feridas emocionais bem amargas nos corações da família. Claro, como filha, não poderia deixar meu rancor ser maior que minha humanidade. Acolhemos a situação do meu pai com seus desafios e com suas dificuldades. Houve momentos difíceis e perturbadores. Tive inúmeras vezes que confrontar minhas questões emocionais não resolvidas com o homem que me abandonou ... para cuidar e amparar ele na velhice e doença. Ainda que nenhum "muito obrigado" tenha saído de seus lábios em todas as vezes que estávamos nos esforçando para cuidar dele, eu sempre senti no meu íntimo que estava fazendo o que era certo e um dia, minha consciência ia me agradecer por isso. 

Lidar com o envelhecimento das pessoas com quem convivemos pode ser difícil e desafiador para toda a família. Acompanhar o deterioramento das funções físicas e psicológicas de quem amamos mexe demais com os nossos valores internos... e nos cobra uma postura a qual a fibra moral deve ser flexível o suficiente para não se rachar com as "pancadas de impotência" que levamos aos estarmos mergulhados nessa situação. Mas ... se não fomos presentes para os "nossos", quem será presente para "nós" quando estivermos na mesma situação?  Ou você acha que não vai envelhecer um dia? Só se você morrer mais cedo, ao contrário disso... a velhice te aguarda daqui uns anos.

Eu penso que... antes de se revoltar com as circunstâncias que a vida lhe colocou, como por exemplo, cuidar de um parente idoso e doente... podia-se exercitar os seguintes pensamentos: o que determinada situação veio realizar em minha vida? Como posso ajudar ele(a) nesse momento? Se eu não tiver compaixão pelo meu próximo, quem terá por mim quando eu estiver no mesmo lugar? Pensamentos assim deveriam permear nossa mente e não o contrário. Temos uma facilidade incrível para dispensar inúmeros cuidados com "bebês", mas não temos o mesmo carinho e cuidado por nossos "idosos". Por que será? Claro, o bebê precisa de cuidados essenciais para sua sobrevivência e cabe aos pais prover toda segurança material e afetiva para essa criança não crescer desamparada. Agora... quando chegamos aos "idosos"... existe uma revolta de filhos em amparar os pais na velhice. Pelo menos é o que vejo ao meu redor. 

Eu sei que sou julgada por algumas pessoas por ter tido a "coragem" de ter colocado um pai no asilo, mas o que as mesmas pessoas não enxergam é que lá, ele não está "desamparado". Tem alimentação correta todos os dias, tem roupa limpa e pessoas que estão lá estão 24h para ampará-lo. Está com seus exames médicos em dia. Nunca lhe faltou medicações. Visito sempre que dar. E olha que eu vivi 27 anos da minha vida, distante dele sem ao menos receber 1 visita (minto, ele me visitou 2 vezes quando eu era criança). Ele tem sua rotina na casa de repouso. Eu tenho minha rotina também. Não preciso parar minha vida para estar 100% cuidando dele. As mesmas pessoas que julgam não são aquelas que acompanharam ele quando estava internado no hospital durante 10 dias exaustivos de revezamento entre familiares, genro e nora para não deixá-lo sozinho nesses dias difíceis. Eu não me sinto culpada por ter colocado ele no asilo e tenho certeza que faço o meu melhor diante dessa situação. Faço o que dou conta de fazer, faço o melhor com o que eu tenho disponível no momento. 

Eu acompanho o drama de algumas famílias, passando a mesma situação: pai/mãe envelhecendo e desenvolvendo doenças, desgastando os filhos que mudaram suas rotinas de vida para olhar "ele/ela". E quando falo a palavra: "asilo", é como se eu tivesse matado alguém. Me olham espantadas, provavelmente achando que eu não tenho coração. Mas algumas situações/casos deveriam ao menos ser discutido ou debatido a possibilidade. E não é. Se insistir no assunto, vira uma guerra homérica. Contudo, essa possibilidade deveria ser analisada com cuidado e com lógica... deixando um pouco as emoções de lado para encontrar uma solução para o "problema".

Pensa comigo: uma casa de repouso tem profissionais preparados para lidar com idosos, tem atividades como fisioterapia e artes. Fornece uma rotina saudável para o idoso. Tem alimentação criada por nutricionista. Tem enfermeiros e cuidadores e os medicamentos são ministrados corretamente no horário. Um profissional/cuidador tem muito mais conhecimento e prática do que EU ou VOCÊ para lidar com os comportamentos de um idoso.  

A lógica é tão simples. 

E outra, a palavra asilo carrega um péssimo estigma, como se estivéssemos colocando os "velhos" em um lugar trancafiado e sem liberdade alguma. Existe tantas casas de repouso que são tão bem equipadas e preparadas para receber essas pessoas que é provável que eles "vivam" muito melhor que nós que estamos inseridos numa rotina estressante do dia-a-dia e se acabando nos antidepressivos para conseguir dar conta da "realidade do mundo". 

Na minha mente autista, esse problema seria resolvido assim. É uma decisão sem "coração"? Sim. Mas ninguém vai ficar desgastado no processo e pelo menos, seu parente vai estar sendo cuidado 24h. 

E outra, o "asilo" só nos assusta porque temos "consciência" da nossa liberdade atual. Mas para um idoso que está desenvolvendo demência, certamente ele não ligará para isso. É sério. Eu conversei com cuidadores/enfermeiros das casas de repouso que meu pai já passou. Meu pai não se lembra absolutamente de nada, nem dos dias traumáticos que foi para todos nós, ficar no hospital com ele. Nós sofremos muito vendo ele naquela situação. Ele não, pois não estava "lúcido e plenamente consciente". Ele nem se lembra de tal situação. O essencial para um idoso é o fornecimento de uma rotina a qual ele poderá acompanhar sem muito estresse e mudança e quanto menos "deslocamento" ele tiver de fazer, melhor ainda. Como eu digo: asilo é ruim para nós, que temos a liberdade de ir e vir, pois temos consciência e discernimento para tomar decisões. 

Eu sei que tem famílias que dedicam de coração a cuidar de um parente idoso/doente sem reclamar, como um gesto de amor a causa e compaixão para com seu semelhante. 

Eu conheço uma pessoa assim: cuida do ex-marido acamado, reclamão e que traiu ela pra viver com outra. E hoje, essa pessoa se dedica de corpo/alma a esse ex-marido que raramente lhe diz um "muito obrigado". É algo fora do comum? Demais. Conhecei uma outra senhora na farmácia que cuida de dois idosos que não tem familiares. Moram com ela. Ela faz isso por amor a causa. Tem pessoas que tem um talento natural para cuidar de outras pessoas. ... Mas algumas ou muitas, precisam desenvolver isso melhor.

Nos tempos que eu estava perdida lá nas aulas de Pedagogia na Uemg (Graças a Deus me livrei desse destino de ser professora kkk), eu tive uma professora inspiradora que cuidava dos dois pais idosos  e ela dizia: eu limpo bunda de criança, eu limpo bunda de adulto, sem frescura, sem nojo. E de alguma forma... isso ficou marcado em mim... e sempre vem a tona nessas situações que eu tenho que realmente limpar a bunda do meu pai e da minha mãe. E eu já limpei! Meu pai estava 15 dias sem defecar. Corremos com ele para Upa e lá foi ele tomar glicerina no rabo. Você não vai acreditar, mas eu vi o maior cocô do MUNDO! E a diaba da enfermeira me deu só 2 gazes para limpar ele em um banheiro que mal tinha papel higiênico. Nojo de limpar meu pai? Frescura de pegar na bosta? Vergonha de ver pinto murcho? Que nada! Tentei encarar a situação normal, afinal, é normal!

Hoje eu rio desse momento e não deixo de carregar lenço umedecido na bolsa para nunca mais passar por isso. Limpar bunda de adulto com 2 gazinha, tá de brincadeira comigo, né?! O bom de passar situação assim, a gente cria algumas pequenas malícias. Falou em levar o velho para UPA? Só se minha mochila estiver equipada com cobertores, um biscoito, lenço umedecido, carregador de celular e água. Só por precaução. Melhor estar prevenida, não é mesmo?

Envelhecer faz parte de uma etapa da vida que segue aquele ciclo que todo mundo conhece:
nascer, crescer,  reproduzir, envelhecer e morrer. 

E nesse ciclo as doenças que o envelhecimento traz consigo também são normais.

Acho que é isso... é sobre isso e nada mais que isso.


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