ATO UM: "O PALADAR"



Acendo o cigarro e o levo nos lábios. Dou uma tragada e solto a fumaça no ar. Acompanho o movimento da fumaça e sua dança irregular. Observo sua inconstância, compenetrado, esperando que um insight surja na escuridão e me ilumine com sua luz. Mas a escassez de iluminação interna não me permite por um instante ser agraciado pelos deuses. Tudo bem. Me conformo com minha escuridão. Me conformo também que deuses não existem. Eles não fazem esforços para que os humanos sucumbam às suas crenças. Por ventura, se os deuses realmente existirem, ouso a dizer que são seres sádicos. Adoram brincar com vidas alheias e impô-las ao sofrimento. Deuses se divertem às nossas custas, transformando a existência humana em uma experiência maquiavélica e dolorosa. Mas hoje, não quero pensar em Deus. Ele já teve tempo demais para intervir a seu favor e me mostrar sua força. Se não interveio, creio que este indivíduo não é tão útil assim para o Universo. 

Volto a observar a fumaça e as vejo desenharem o vazio existencial deste humano que está mergulhado na escuridão. Respiro profundamente e os olhos permanecem secos. Não há mais lágrimas. Existe apenas uma alma que exprime sua secura. Resolvi que este seria o meu último dia. Tudo está devidamente programado e não narrarei a forma como irei morrer nas próximas horas para evitar problemas futuros. Não quero que familiares saibam o que me levou à morte voluntária. Deixo que a suposição e o mistério rondem a minha morte. Eles jamais saberão a causa e isto partirá comigo, no silêncio do túmulo. Às vinte horas assino meu atestado de ida, somente ida. Não volto e espero não existir mais. Parto deste mundo que não se importará com um morador a menos.  Afinal, morrem tantos e quem se importa? Estarei longe da hipocrisia humana e ainda bem que não verei as lágrimas de crocodilo dos que fingem gostar de mim.

Olho para o relógio e são exatamente oito horas da manhã. Jogo a bituca de cigarro no chão e decido tomar um banho. Este será o último banho da minha existência e o farei digno de ser o último. Me dirijo ao banheiro, tiro a roupa e um papel amassado cai do bolso: uma pequena lista que escrevi dias anteriores com alguns afazeres. 

Último dia na terra [aleluia]

*Fazer as coisas do cotidiano da melhor forma o possível, afinal, você as fará pela última vez.
*Tomar coragem e chamar a Cristina para almoçar com você. Não tem nada a perder levando o fora da mulher mais bonita do escritório, afinal, é seu último dia na terra e se você levar um fora, o fora vai ser enterrado contigo às vinte horas.
*Pedir demissão do emprego chato, dizer umas verdades para aquele chefe ordinário e dar a louca no escritório. Não se envergonhe e nem pense nas consequências.
*Ir no restaurante e pedir o prato favorito. Evite fastfood, coma algo que vale a pena.


Com a lista nas mãos, me pergunto o que ganharia cumprindo aqueles pedidos que soam um tanto babaca e sem sentido. Mas confesso que um deles iria realizar minha verdadeira vontade. Sempre quis chamar a Cristina para sair desde o primeiro dia que a vi entrando triunfalmente pela porta do escritório, jogando seus cabelos encaracolados de lado e sorrindo de forma ingênua e maliciosa. Cris era o tipo de mulher que conseguia deixar qualquer homem boquiaberto por sua beleza e graciosidade. Entretanto, contudo, todavia, porém, a timidez nunca me permitiu ultrapassar o limite do “oi”. Para ela, eu poderia ser um simples colega de trabalho: desleixado, fracassado e mal pago comido. Mas hoje, excepcionalmente hoje, abro uma exceção no calendário e convidarei ela para almoçar comigo. 

Tomo banho, diga-se de passagem, o melhor do mundo e me apronto para ir ao trabalho. Resolvo deixar o carro na garagem e vou caminhando. De casa até o serviço, o percurso me exigia trinta minutos do tempo. Enquanto caminho, reparo a banalidade que se tornou a vida moderna. A promessa da modernidade e o slogan que a existência seria mais cômoda e fácil, não tornaram as pessoas mais felizes e, sim, mais incapacitadas. A impotência humana foi adquirida com avanço da tecnologia que engoliu a engenhosidade humana e a trocou por likes e exposição desnecessária em redes virtuais, colocando a autoestima de um indivíduo em uma espécie de balança discriminatória. Você é avaliado pelo o que tem ou aparenta ter. Essência? Só se for de perfume e não pode ser barato não, viu, porque se veste a marca e quanto mais cara, melhor para os visualizadores. Felicidade instantânea faz mal, tão mal quanto um miojo e você só vê o estrago dela depois de um tempo. Sabe quando seu estomago não aceita uma comida por estar enjoado? Felicidade instantânea é assim. Nos humanos, o estrago que ela causa chama-se solidão. Independente de quantas curtidas uma foto sua recebe, no final do dia, você está só consigo mesmo e ninguém está conectado a você.  Ah. Que arrogância minha achar que sei o que é melhor para todos. Meu ego nojento não se cansa destas analises sobre a existência humana. Meia volta, me deparo com minha prepotência e como sempre, ela me arrasa. Mas para quê ficar pensando nestas coisas? Que diferença poderei fazer neste mundo se ele já estava corrompido antes mesmo de eu nascer? O palco já está montado e somos meras marionetes, seguindo o roteiro dos que realmente controlam este planeta azul.

Sigo o percurso até o trabalho observando atentamente a vida, desta vez, sem pensamentos para instiga-la. Chego no serviço e vou direto para minha mesa. Ligo o computador e sou interrompido:

- Isso são horas de chegar, Paulo?

Olho para o lado e dou de cara com meu chefe. Esporro a esta hora da manhã? Dá um tempo!

- Bom dia para você também, Geraldo. 

- Quero o relatório para as onze sem falta! 

Dou com ombros e deixo ele falando sozinho. Que saco. Logo no dia que resolvo morrer, tem esses indivíduos para testarem nossa paciência. Indivíduos como Geraldo existem para irritarem os seres humanos. Por causa de criaturas como ele, a vida se torna algo estressante e dificultoso. Mas tudo bem, só por hoje farei este trabalho de maneira honesta e sem procrastinações. Me concentro para finalizar o serviço antes do horário. Foi só eu digitar as primeiras laudas e sinto um aroma adocicado no escritório. Aquele perfume inconfundível era da Cristina. 

- Bom dia, Paulo! – Disse em um tom animado.

- Olá Cristina.    

Ela sorri para mim e passa as mãos no cabelo delicadamente. Enquanto viajo na sua beleza, lembro do papel com pedidos idiotas. Se é o meu último dia na terra por que não tentar a sorte? Sorte? Não achei que a palavra sorte poderia brotar na mente do ser humano mais azarado do planeta. Sorte ou azar? Que diferença isso faz para quem decidiu que irá morrer nas próximas, digamos, sete horas? 

Sem esperar que o silêncio se torne algo constrangedor entre nós dois, pergunto:

- Cristina, gostaria de almoçar comigo no restaurante da esquina?

Cristina olha para mim assustada e não demora a responder:

- Adoraria almoçar contigo hoje, mas...

Ih! Deu ruim. 

- Paulo, vamos sim! Qual é o horário do seu almoço?

- Pode ser meio-dia? Te encontro na portaria. 

Ih! Deu bom. 

Ela afirmou positivamente com a cabeça e se despediu com um gesto de “até logo”. Despedi-me dela sem disfarçar o sorriso que ia de um canto da orelha para o outro. Isso foi a sorte me dizendo que não sou um cara tão azarado assim? AH, tanto faz! 

Feliz, terminei o trabalho antes do horário. 

Fui até a sala do chefe para entregar o relatório, quando o infeliz me solta:

- Já terminou o relatório, Paulo? Não acredito que foi capaz...

- Isso é para você que adora duvidar da capacidade dos outros. 

Geraldo me olhou atravessado e soltou:

- Isso é jeito de falar com quem é superior a você? Você sabe quem eu sou?

Então, se vou morrer, que eu morra sem arrependimentos. Abri a porta da sala do chefe que dava de frente as outras mesas e falei em voz alta:

- Quem você pensa que é? Você quer mesmo saber? Então, deixa eu explicar para você. Você é um "serumaninho" que vive entre sete bilhões de indivíduos neste planeta azul chamado Terra e este planeta está em uma galáxia com mais de 400 bilhões de estrelas e esta galáxia é apenas uma entre as 100 bilhões existentes no UNIVERSO. Quem eu penso que você é??? Você quer mesmo saber com quem EU estou falando?

- COMO OUSA?

- Olha só, Geraldo, por graça divina (?), estou bem complacente com sua arrogância e só posso lhe dizer uma coisa para alegrar o seu dia: Vá para o quinto dos infernos!

- Está demitido! 

- Está me fazendo um favor me demitindo desta espelunca. 

Vejo a raiva nos olhos do Geraldo. Pimenta nos olhos do outro é refresco para o meu. Deixo ele sozinho na sala, aos berros e vomitando todo o seu veneno. Passo pelas cabines dos meus ex-companheiros do trabalho escravo e eles me olham com admiração e certa repulsa. Ótimo para meu sadismo mórbido. Adoro ver a dualidade das emoções humanas. Pego minhas coisas e coloco tudo numa caixa. Antes de sair pelas portas, sou abordado pela Cristina. 

- Paulo! O que aconteceu entre você e Geraldo?

- Fui abençoado com a demissão. – Não conseguia disfarçar minha alegria. 

- E o nosso almoço? Éramos para nos encontrarmos daqui uma hora! 

Cristina preocupada com o nosso encontro, digo, almoço?

- Por que não vamos nesse exato momento?

Cristina olha para mim e ver em meus olhos um desejo estranho em querer fazer loucuras. Eu não estava preocupado se ela antecipasse o horário do almoço para estar comigo alguns minutos a mais e muito menos se ela se recusasse, tudo bem, entenderia sua necessidade de manter a aparência de boa moça. 

O não ou sim dela não me impediria de viver esse dia loucamente. 

- Vou pegar minha bolsa. Me espera aqui! 

Mulheres e seu sexto sentido. E não é que funcionam? Acham que estão com a bola toda e que mandam na relação. No menor sinal detectado de indiferença, elas ficam apavoradas, mandam mensagens desesperadas com medo de perderem as atenções de seus homens. 
Mas Cristina poderia respirar aliviada. Minhas atenções sempre estariam destinadas a ela. 

- Para onde vamos? – Falou um pouco afobada. Será que correu até sua sala achando que eu fugiria?  

- Qual lugar você sugere? – Devolvo com outra pergunta. Ela fica meio desnorteada com o poder de decisão em suas mãos. Pensou rapidamente e disse:

- Tem um lugar que você vai adorar! – Respondeu com aquele sorriso destruidor. Adorei a presunção dela em achar que eu poderia gostar do lugar que me levaria. 

Caminhamos algumas quadras do escritório até um restaurante com uma fachada bem “europeia”. Adentramos no recinto e somos recepcionados pelo garçom que nos dirigiu a mesa. Sem cerimônias pedi um vinho do porto. Cristina me olhou surpresa e fez um “tudo bem” com a cabeça. O garçom trouxe aquela bela garrafa que custava nada menos que mil reais e nos serviu a bebida. Não estava me preocupando se gastaria muito neste almoço. Tinha bastante dinheiro na conta, o suficiente para comprar oitenta garrafas se o quisesse. Após pedirmos os pratos, Cristina dá o primeiro gole e me indaga:

- Por que só hoje? 

- Só hoje o quê? – Sim, sou meio lerdo para entender o que está por trás das perguntas das mulheres. 

- Isso aqui! – Gesticulou com as mãos – De me chamar para almoçar. Por que só hoje?

Dou um gole na bebida. Vinho do porto. UHUM. Caro, mas saboroso. Cristina continua olhando para mim, esperando uma resposta. 

- Não sei. Só queria fazer algo diferente. – Melhor não dizer nada para não entregar na bandeja que sempre fui louco por ela desde o primeiro instante que a vi. 

- E fez coisas diferentes até demais! Você foi demitido do serviço. Como se sustentará daqui para frente? – Perguntou com uma genuína preocupação. E sei que a preocupação dela é sincera, mas hoje não estou com saco para pensar no que faria daqui para frente, afinal, daqui algumas horas estarei me matando e pouco me importa o dia de amanhã. 

- Cristina, vamos só viver este momento?

Ela percebe que não quero conversar muito sobre isso. Pedimos mais uma taça para o Garçom e peço para que ele deixe a garrafa. Começamos a contar casos que aconteceram no escritório e sobre as particularidades de determinadas pessoas. Riamos das fofocas e nos divertíamos falando mal das pessoas. 

- Geraldo? Geraldo é um sádico pervertido que se acha superior a todos! Você lembra do primeiro dia que entrei? 

Como eu poderia esquecer deste dia? 

- Geraldo veio com conversa mole para o meu lado, todo animadinho, dando em cima de mim. Odeio quando os homens se comportam feito cachorros! Parecem que pensam mais com a cabeça de baixo que com a de cima. 

- Eu lembro do seu primeiro dia, Cristina. Mas aqui, convenhamos. Você é uma bela mulher e todos naquele escritório ficaram dias comentando sobre sua beleza. - O álcool não está me deixando ter controle do que falo. 

- Até mesmo você? – Me indagou e desta vez pude ver em seus olhos um desejo reprimido por mim. Não. Espera. A Cristina tem interesse neste ser humano aqui? Isso é uma piada. 

- Confesso que você é uma bela mulher, mas há outros quesitos além da beleza que me conquistam numa dama. 

Ela olha de forma provocadora e solta aquele belo sorriso.  

- E posso saber quais são?

Antes que pudesse responder, somos interrompidos pelo garçom e ele serve o almoço. Ótimo! Este almoço chegou exatamente no momento que não precisarei responder perguntas cabeludas. Cristina agradece o serviço do garçom e dispensa-o. A moça dá um gole no vinho e diz:

- Você não respondeu à pergunta, Paulo. 

Coloco um pouco mais de vinho no copo e digo:

- Cristina, a beleza feminina é mistério. E como todo mistério, ele não precisa de explicações para ser apreciado. 

- Você é um mistério, Paulo. 

- Em que sentido? Você me acha feminino? 

Rimos juntos. O vinho tem o poder de deixar nossas palavras soltas. 

- Você sempre foi diferente dos homens que conheci. Todos os homens, sem exceção, se aproximavam de mim com intenções maliciosas. Você foi o único que me tratou diferente. 
Como assim? Eu e ela mal trocávamos uma palavra. 

- Sei que conversamos pouquíssimo, mas em todas as conversas percebia sua gentileza e educação. E por alguma razão, me sentia valorizada com esses pequenos gestos. 

- Não sei nem o que dizer...

- Não precisa dizer nada. Deixa disso! Vamos comer antes que esfrie. 

Dito isso, ela deu a primeira garfada e colocou mais um pouco de vinho no copo. As palavras cederam lugar ao silêncio. Comíamos absortos em nossos pensamentos. A quietude não era constrangedora, mas me perturbava. O vinho começava a reverberar no meu estômago dando-me azia. Seria efeito de toma-lo com o estômago vazio? O copo, talvez, nunca tenha ficado cheio e cada gole era para disfarçar minha incompletude interior. Eu não queria pensar em nada nesse momento, mas o vinho tinha um estranho poder de tornar visível algumas dores.

Cristina pediu licença para ir ao banheiro e acenei positivamente com a cabeça. Acendo um cigarro e na primeira tragada, sinto certo alívio. Irônico é achar que o alívio de uma tragada é aquilo que me mata. E que não estamos matando uma ansiedade e sim, adiando sua repercussão. Vejo a mulher retornar do banheiro com um olhar apreensivo. Ela senta, joga os cabelos para trás e sinto que queria me dizer algo. 

- Quero desabafar algo contigo. 

Acertei.

- Fique à vontade. 

- Será que poderíamos ir para outro lugar?

Afirmo com a cabeça e chamo o garçom para fechar a conta. Saímos do restaurante e vamos para uma praça perto dali. Esperando o momento certo, Cristina diz sem cerimônias:

- Estou pensando em me matar. 

Olho para ela espantado com sua revelação. Cristina quer se matar? Não. Calma. Ela ainda está com dúvidas e não sabe se realmente quer morrer. Se soubesse, não diria para ninguém sua decisão. 

- Você tem certeza disso?

Céus! Eu fiz essa pergunta mesmo? Até parece que estou incentivando ela a cometer um ato suicida. Não posso dizer nada, pois minha morte está programada para o final deste dia. Entretanto, confesso espanto à sua declaração. 

- Eu pensei tanto sobre isso! Não encontro mais razões para viver. - desabafou. 

Nem eu! O mundo dá mais razões para desistir da vida do que para vive-la. É um saco nascer e ter que encontrar justificativas para a cruel experiência de ser humano.  

- Que tipo de razões você gostaria que a vida lhe desse, Cristina?

Ela demora para responder. Eu levei trinta anos para descobrir que a vida não dar razões. As pessoas buscam através da filosofia, da arte, da literatura, da religião, do dinheiro; justificativas para seus atos, pois assim poderiam enganar todo o vazio existencial que elas sentem. Mas, uma hora percebem que o buraco é profundo e insaciável. O indivíduo nunca está satisfeito e estará sempre nessa busca insana por mais. 

- Eu queria amar e ser amada verdadeiramente! Estou cansada de relacionamentos superficiais. 

E só por causa da sua carência emocional você irá se matar? Tudo porque acha impossível encontrar uma pessoa que se encaixe nas suas expectativas e seja a representação real da sua idealização? Ótima justificativa. Esse papo de Amor e todo idealismo que foi construído sob ele tem feito as pessoas se enganarem em suas buscas. A utopia do amor romântico é produto desta mídia barata que vende ilusões aos corações sonhadores. Sonhar é um risco e sequer a própria realidade imagina que existam sonhos. 

- Eu não poderia lhe dizer para não fazer algo que se deseja. Se você acredita que se matar vai solucionar este problema, tudo bem, vá em frente.

- Você não se importa?

- Olha, importar, eu me importo, mas a decisão pelo seu bem-estar cabe a ti e não a mim.

- Nossa... 

- O que foi?

Disse algo errado? Claro que não. As pessoas adoram comentar sobre o que fazem das suas vidas, esperando uma aprovação dos outros. Entretanto, não tenho vocação para comentarista da vida alheia e não sou guru para guiar alguém a iluminação. Quando mais novo, acreditava que poderia ajudar as pessoas. Hoje, tenho a certeza que não ajudo ninguém. 

- As pessoas diriam que estou maluca. 

- Sou uma exceção à parte, Cris. 

- Estou vendo. Então você não se importa que eu me mate?

Ela queria ouvir exatamente o quê de mim? Afinal, a vida é dela ou minha? Pessoas e suas manias de atribuírem suas decisões aos outros. O que tenho a ver com a vida dela? Absolutamente nada. 

- Você não está fazendo a pergunta para pessoa errada?

Cristina balança afirmativamente a cabeça e permanecemos em silêncio por alguns segundos. Por alguma razão, eu me sentia incomodado com aquela declaração. Tudo bem. Não quero achar que sou o único que pode se matar. Pelo contrário. Não privo ninguém de tomar esta decisão. O ser humano onde quer que ele esteja, lutará para viver mais um dia por mais difícil que seja a vida! Desistir da vida é sinônimo de covardia por essa razão. Estranho, não? Por que desistir da própria vida seria considerado um ato covarde se esta é uma das decisões mais difíceis de se tomar? Sua própria vida pode ter lhe esgotado oportunidades e dificultado a resolução de problemas. Uma existência pode ter sido esmagada pela pressão da sociedade e por não suportar mais o peso, decidiu que a morte poderia pôr fim nesta cruz. Agora... O que tinha de errado na vida da Cristina para que ela cogitasse um suicídio? Ela é uma bela mulher: admirável, trabalhadora, inteligente, dócil e bonita. Não consigo enxergar motivos plausíveis para realização deste ato. E confesso, que isso me instiga a curiosidade para descobrir suas reais motivações.   

- O que fará por agora, Paulo? – Perguntou Cristina aparentando estar entediada com o silêncio.

Planos? Não os tenho mais. Tudo o que escrevi naquela lista idiota consegui realizar em menos de duas horas. 

- Eu.... Estou livre hoje. Por que? 

- Gostaria de passar a tarde contigo. 

- Você não tem que voltar a trabalhar?

- Não volto mais para aquele lugar, não hoje. 

Cristina deu aquele sorriso destruidor, jogando os cabelos para o lado e me olhando de uma forma completamente sensual. Céus! Como essa mulher era capaz de seduzir um homem assim? Naturalmente? 

Pensei em recusar seu pedido, mas lembrei de um desejo que ainda não tinha sido cumprido daquela lista tola: “viver o dia como se fosse o último”. E por essa razão, não poderia dispensar o convite de Cristina para passar o dia com ela. Ainda que este dia representasse apenas algumas horas, não recusaria essa oportunidade. 

- Onde iremos?

Continua...

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